Eu e o McGregor temos hobbies bastante diferentes. Quando começámos a namorar, tratávamos estas pequenas áreas de diversão de cada um com um grau feroz de suspeita e medo, mas a pouco e pouco aprendemos a olhar para o mundo um do outro apenas com uma benevolente descrença. Na prática, isto significa que o McGregor é arrastado todas as semanas para um cinema independente e não vê um filme sem legendas há anos (leia-se filme em língua inglesa), e que eu continuo, uma vez por ano, a resmungar de cada vez que tenho que subir a uma montanha sem uma refeição de três pratos a meio caminho.
No entanto, este fim de semana decidi que ia ser Uma Namorada Melhor (UNM). Não é coisa que me aconteça com frequência, e que só pode ser explicada pelo facto de termos acabado de regressar do casamento do Stuart. O Stuart, o meu mais ancestral amigo nas terras de sua majestade, é o homem mais cínico, negativo e descrente que eu conheço. Ora se até o Stuart está preparado para sair do mundo negro em que vive para cair nas graças do amor, não há razão para eu não dedicar pelo menos um dia ao projecto UNM, e prestar mais atenção aos interesses do McGregor. E foi assim que, ao regressarmos do casamento, passámos numa estrada onde estavam prestes a iniciar um rally. Era meio-dia.
- Podemos parar para ver McGregor, já que gostas de carros e assim…
- Não, está tanto calor hoje, devíamos ir para a praia. E desde quando gostas de ralies?
- Eu não gosto, mas tu gostas, e acho que devíamos parar para ver.
- Mas clô só vale a pena parármos se tu achares isto divertido.
…
[clô chamando todas as forças mentirosas do universo ao projecto UNM]
- Pois, olha… pode ser divertido, se subirmos àquele monte para olhar para a paisagem e para [gulp] o rally…
[e por fim, usando do argumento luso arrasador de que tudo, mas tudo, é suportável desde que haja comida envolvida]
- E levamos os morangos e framboesas que apanhámos na quinta e fazemos um piquenique!
Estacionámos para além do cruzamento onde estava um pequeno sinal que anunciava o fecho da estrada da uma até às seis da tarde. Subimos ao monte, contemplámos a paisagem e os subarus ensurdecedores que saltavam no sopé da colina. Trinta carros muito barulhentos depois, em harmonia total, o casal luso-celta regressa ao carro, contente por aquela pequena conquista, uma vitória da tolerância doméstica sobre o mundo fascista do desporto automotor. E eis senão quando percebemos que tínhamos estacionado numa zona barricada, reservada para a organização. Estacionámos no único trecho de estrada completamente fechado durante aquelas cinco horas do rali. E houve reclamação e polícia, e barafustar para trás e para a frente, com o McGregor a ameaçar que ia atravessar a barreira de qualquer maneira e tirar-nos dali para fora, ao jeito do Knight Rider. Mas não havia volta a dar-lhe: por ordem policial ficámos sentados no carro, a ver as horas da tarde a passar, cinco horas completas do princípio ao fim, stressados e tensos, à espera da abertura da estrada.
Parece-me isto um grande abanão no projecto UNM. O respeito pela outra metade do casal é, sem dúvida, um sacrifício que se paga caro.