Ele parecia bom rapaz, mas o instinto disse-me que algo não estava certo quando no primeiro “date” ele perguntou: “Ouvi dizer que as raparigas espanholas têm muitos pelos. É verdade?”. Ora, perante esta afirmação, só existia uma solução. E não, não era a depilação. O que me pareceu óbvio na altura, e que posso com confiança recomendar a todos os principiantes relacionais, era que no próximo date não podia ir sózinha. Levei sete amigas, coisa que nem a Edite conseguiria fazer num dos seus piores dias de tribalismo gregário. Olhando para trás, eu até compreendo a tentativa de ele fazer uma aproximação multi-cultural a moi même, ao introduzir o tema regional ibérico, mas a verdade é que os espanhóis são espanhóis e os portugueses são portugueses. Nem o presunto se chama a mesma coisa (jámon embutido e presunto fumado), por isso não valia a pena trazer à conversa o queimar do porco só para nos livrarmos da leve penugem que cobre a pele.
Eu já devia ter desconfiado, porque no dia em que eu conheci o mcgregor, ele teve outra destas tiradas que pertencem ao mundo do humor masculino, mas que caem em saco roto nas míudas. Ao cruzarmo-nos no lavatório comum de um bar, ele disse-me entre uma ensaboadela e outra, de sorriso redondo na cara: “eu nunca na vida tinha lavado as mãos com uma rapariga”. Estas palavras, embora bem mais raras do que as máximas populares do “ai que agora ficou aqui tanto calor”, despertaram em mim um sentimento desconfortável de suspeita. Será que ele tinha frequentado uma escola só para rapazes? Ou seria mesmo totó?
Todas as suspeitas caíram por terra naquela noite gelada de Londres, na mesma altura em que o repórter John Simpson da BBC caminhava radiante em direcção à capital do Afeganistão. Nem ele sabia que iria uns meses depois aterrar no Iraque, e levar com um estilhaço de bomba na perna, nem eu imaginava que era possível ir viver para uma cidade ainda mais fria, a nobre capital de Edimburgo, onde os preços para arrancar pêlo da perna são escandalosos. Isto anda tudo ligado e não há coincidências, como diz esse grande vulto da literatura portuguesa.